Invocação Cabalística
De Rabi Salomão, filho de Babirol
Vós sois um, começo de todos os números e o fundamento de
todos os edifícios;
Vós sois um, e, no segredo da vossa unidade, os homens mais
sábios se perdem porque não a conhecem.
Vós sois um, e a vossa unidade nunca diminui, nunca aumenta,
nem sofre alteração alguma.
vós sois um, não como um em cálculo, porque a vossa unidade
não admite multiplicação, nem mudança, nem forma.
Vós sois um, ao qual nenhuma das minhas ideias pode fixar um
limite e dar uma definição; é por isso que vigiarei a minha conduta,
preservando-me de pecar pela minha língua.
Vós sois um, enfim, cuja excelência é tão elevada, que de
modo algum pode cair, e não como este um que pode cessar de existir.
Vós sois existente; contudo, o entendimento e a vista dos
mortais não podem alcançar vossa existência nem por em vós o onde, o como e o
porquê.
Vós sois existente, mas em vós mesmo, porque nenhum ser pode
existir convosco.
Vós sois existente desde antes do tempo e do espaço.
Vós sois existente, e enfim, vossa existência é tão oculta e
tão profunda que ninguém pode penetrar e descobrir o segredo dela.
Vós sois vidente, mas não desde um tempo conhecido e fixo;
Vós sois vivente, mas não por um espirito ou por uma alma;
pois sois a alma de todas as almas.
Vós sois vivente, mas não como as vidas dos mortais, que são
comparadas a um sopro e cujo fim será o alimento dos vermes.
Vós sois vivente, e aquele que puder alcançar os vossos
mistérios gozará eternas delícias e viverá perpetuamente.
Vós sois grande, e ao pé da vossa grandeza, todas as
grandezas se dobram, e tudo o que há de mais excelente se torna defeituoso.
Vós sois grande, acima de todas as imaginações e, vos
elevais acima de todas as hierarquias celestes.
Vós sois grande, acima de todas as grandezas, e sois
exaltado acima de todos os louvores.
Vós sois forte, e nenhuma das vossas criaturas poderá ser
comparada à vossa Entidade.
Vós sois forte, e é a vós que pertence esta força invencível
que nunca muda nem se altera.
Vós sois forte, e pela vossa magnanimidade perdoais no
momento da vossa mais ardente cólera, e vos mostrais paciente para com os
pecadores.
Vós sois forte, e as vossas misericórdias, que existiram em
todos os tempos, se estendem sobre todas as vossas criaturas.
Vós sois a luz eterna, que as almas puras verão e que a
nuvem dos pecadores ocultará aos olhos dos pecadores.
Vós sois a luz eterna, que está oculta neste mundo e visível
no outro, onde a glória do Senhor se mostra.
Vós sois soberano, e os olhos do entendimento que vos
desejam ver, ficam admirados de só poderem fazê-lo em parte e nunca totalmente.
Vós sois o Deus dos Deuses, o atestam todas as vossas
criaturas; e, em honra deste grande nome, todos a vós devem dar o seu culto.
Vós sois Deus, e todas as criaturas são vossos servos e
adoradores; a vossa glória não é diminuída embora adorem outros, porque a sua
intenção é de se dirigirem a vós.
São como cegos que têm de seguir o grande caminho e se
desviam: um cai num poço, outro num buraco; em geral, todos julgam ter
alcançado seus desejos e fatigam-se em vão.
Mas os vossos servos são clarividentes, e andam por um
caminho certo de que nunca se desviam, nem à direita nem à esquerda, até
entrarem no átrio do palácio do rei.
Vós sois Deus, que sustentais por vossa divindade todos os
seres, e que assistis por vossa unidade a todas as criaturas.
Vós sois Deus, e não há diferença entre vossa divindade,
vossa unidade, vossa eternidade e vossa existência; porque é um mesmo mistério;
e embora variem, todos chegam ao mesmo fim.
Vós sois sábio, e o ancião dos anciões, e a ciência sempre
se nutriu junto a vós.
Vós sois sábio, e não aprendestes a ciência de ninguém, nem
a adquiristes senão de vós mesmo.
Vós sois sábio, e como um operário arquitecto, reservastes
da vossa ciência uma divina vontade, para num tempo determinado atrair do nada
o ser, da mesma forma que a luz sai dos olhos é atraída pelo seu próprio
centro, sem nenhum instrumento ou objecto.
Esta divina vontade cavou, traçou, purificou e fundiu; ela
ordenou ao nada que se abrisse, ao ser que se aprofundasse e ao mundo que se
estendesse. Ele mediu os céus a palmos: com o seu poder reuniu o pavilhão das
esferas, com os cordões do seu poder fechou as cortinas das criaturas do universo,
e tocando, com a sua força, as extremidades da cortina da criação, reuniu a
parte superior à inferior.